Redes e raízes são elementos recorrentes nos desenhos, bordados, animações e escritos de Gustavo Caboco. Nascido em 1989 em Curitiba, o artista vivenciou sua identidade indígena nas palavras e gestos de sua mãe, Lucilene, que foi desterrada de da comunidade Wapichana da terra indígena Canauanim (Roraima), aos dez anos de idade. Em 2001, Caboco acompanhou sua mãe em seu primeiro retorno, e então viu se multiplicarem os vínculos com a cosmovisão e a história de luta de seu povo. A obra pluriforme e processual de Gustavo Caboco se produz justamente nesses caminhos de retorno à terra, no fortalecimento das raízes com a terra e seus parentes, ecoando as vozes do povo Wapichana e dos entes a quem eles sabem dedicar escuta, como as plantas, as pedras, as serras, os céus e os rios. É dessa forma que o artista costura o pessoal ao político e o cultivo da memória às possibilidades de futuro.
O primeiro livro de Caboco, escrito e desenhado após o incêndio ocorrido no Museu Nacional do Rio de Janeiro em 2018, chama-se Baaraz Kawau – “o campo após o fogo” em língua Wapichana. Sua narrativa cruza a história de uma borduna Wapichana que o artista visitara na coleção do museu com as histórias de Casimiro Cadete, seu tio avô e grande liderança de seu povo. Consumida pelo fogo, a borduna tinha a mesma idade de Casimiro quando este faleceu. Isso desencadeou em Caboco um fluxo de associações e reminiscências sobre a vida e as memórias indígenas, sistematicamente confrontadas pela destruição predatória que caracteriza a cultura ocidental.
Na 34ª Bienal, Gustavo Caboco apresentará Kanau'kyba, uma proposição desenvolvida em conjunto com sua mãe, Lucilene Wapichana, e seus primos Roseane Cadete, Wanderson Wapichana e Emanuel Wapichana. O trabalho se deriva de um ateliê em deslocamento a partir de encontros com diferentes paisagens que conectam as pedras do céu às pedras da terra ancestral. Nesta jornada, a família Wapichana rememora os rastros das bordunas antigas para que as visões das bordunas presentes também possam caminhar. A obra ganhará corpo por meio de uma instalação composta por registros de performances, fotografias, vídeos, desenhos, pinturas, animações e objetos.
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Caroline A. Jones, Eyesight Alone: Clement Greenberg’s Modernism and the Bureaucratization of the Senses (Chicago: University of Chicago Press, 2005).
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Greenberg’s Modernism and the Bureaucratization of the Senses (Chicago: University of Chicago Press, 2005).