A cidade de Karachi era parte da Índia quando nasceu Nalini Malani (1946, Karachi, Paquistão). Logo no ano seguinte, porém, a partição do território entre a Índia e o Paquistão levou sua família, como muitas outras, ao exílio forçado. Malani refugiou-se nas cidades então chamadas Calcutá e Bombaim, respectivamente, estabelecendo-se nessa última. A brutalidade dessa divisão é constantemente abordada nas obras e depoimentos da artista, que por vezes cita a célebre frase de Simone Weil, “a destruição do passado é talvez o maior de todos os crimes”. Destruir o passado, nesse sentido, significa apagar a memória de violências que, mesmo dolorosas, precisam ser lembradas para que se percebam suas atualizações no presente. Com seus vídeos, instalações, performances, desenhos, pinturas e animações, Malani contribui para a durabilidade da memória e para a renovação da capacidade de afetar-se por ela. Desenvolvida já por mais de cinco décadas, sua obra forma um amplo panorama que reúne tanto personagens míticos femininos quanto anotações cotidianas para responder a traumas que vão desde conflitos geopolíticos e religiosos até violências de gênero e raça.
Reconhecida como uma artista pioneira, Malani está comprometida com a experimentação desde o princípio de sua trajetória. Logo após sua graduação na Sir Jamsetjee Jeejeebhoy School of Art, em Bombaim, tornou-se a mais jovem artista a frequentar o VIEW (Vision Exchange Workshop) – uma iniciativa que ofereceu estrutura para suas primeiras fotografias e filmes em 8 e 16mm. Dentre esses experimentos está Onanism (Onanismo, 1969), filme que tem início com a vista superior de uma jovem deitada em uma cama. Seus movimentos tornam-se mais e mais convulsivos, enquanto os planos se aproximam de detalhes de seu corpo e feição. A ação da personagem é ambivalente e oscila entre erotismo e agonia – parece haver enorme carga de energia encapsulada em seu corpo e enquadrada pela cama, pelo quarto e pela câmera. A opacidade gerada por esses múltiplos enquadramentos soma-se ao título da obra para desafiar convenções de gênero e domesticidade.
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Caroline A. Jones, Eyesight Alone: Clement Greenberg’s Modernism and the Bureaucratization of the Senses (Chicago: University of Chicago Press, 2005).
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Greenberg’s Modernism and the Bureaucratization of the Senses (Chicago: University of Chicago Press, 2005).