Mariana Caló (1984, Viana do Castelo, Portugal) e Francisco Queimadela (1985, Coimbra, Portugal) conheceram-se na Escola de Belas Artes do Porto e têm trabalhado em colaboração desde 2010. Em sua prática, eles combinam filme, fotografia e escultura para criar instalações intimistas e imersivas, nas quais os limites entre sonho, realidade, ficção, objetividade e espontaneidade são constantemente alterados e diluídos. A obra ocorre entre todos esses diferentes domínios, e apesar da atmosfera fantástica que muitas vezes transmitem, a maioria dos projetos se baseia em processos que se desenvolvem ao longo do tempo, seja em pesquisa e investigação, seja em trabalho de campo, ou em metamorfoses internas à sua prática continuada, manifestando preocupações ambientais e o diálogo entre o biológico, o vernacular e o cultural. Embora algumas das primeiras obras envolvessem uma reflexão sobre o significado físico, filosófico e simbólico de tópicos densos como o tempo, obras mais recentes seguem um caminho complementar, visando captar um vislumbre do extraordinário que pode ser revelado no cotidiano.
Em Efeito orla (2013), uma das obras da dupla incluídas na 34a Bienal, esses aspectos da prática de Caló e Queimadela estão condensados e postos em relação. Este projeto é o resultado de uma pesquisa sobre o lince-ibérico, o felino mais ameaçado do mundo, considerado praticamente extinto na área da Reserva Nacional da Serra da Malcata (Portugal), que foi criada nos anos 1980 para proteger essa espécie e onde a obra foi desenvolvida. Segundo alguns habitantes da serra da Malcata com quem os artistas conversaram, o lince “é sentido, mas não visto”, é evasivo e quase invisível. A mitologia vincula-o ao segredo e à revelação de verdades ocultas, ao mundo dos mortos, ao sol e à luz. Em Efeito orla evoca-se o espectro do lince, indo ao encontro de locais que ele habitou até recentemente e de relatos de avistamentos partilhados na primeira pessoa, episódios majoritariamente violentos, associados ao seu estado atual de preservação. Embora o animal em si não apareça na tela, Caló e Queimadela introduzem na paisagem diferentes discos ópticos, um dispositivo que, segundo eles, “se refere às noções de aparição, ilusão, deslumbramento, camuflagem e velocidade, que relacionamos à ideia de uma presença invisível que continua a orbitar aquele lugar”.
Apoio: República Portuguesa – Cultura / Direção-Geral das Artes e Fundação Calouste Gulbenkian
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Caroline A. Jones, Eyesight Alone: Clement Greenberg’s Modernism and the Bureaucratization of the Senses (Chicago: University of Chicago Press, 2005).
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Greenberg’s Modernism and the Bureaucratization of the Senses (Chicago: University of Chicago Press, 2005).