Uýra

Vista das obras [view of the artworks] de [by] Uýra na [at the] 34th Bienal de São Paulo. © Levi Fanan / Fundação Bienal de São Paulo
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Vista das obras [view of the artworks] de [by] Uýra na [at the] 34th Bienal de São Paulo. © Levi Fanan / Fundação Bienal de São Paulo
Vista das obras [view of the artworks] de [by] Uýra na [at the] 34th Bienal de São Paulo. © Levi Fanan / Fundação Bienal de São Paulo

Uýra (1991, Santarém, Pará) é uma entidade híbrida, o entrelaçar dos conhecimentos científicos da biologia às sabedorias ancestrais indígenas. Chama as plantas por seus nomes populares e em latim, e assim evoca suas propriedades medicinais, seus gostos, seus cheiros, seus poderes. O resultado é uma compreensão complexa e intrincada da mata, um emaranhado de conhecimentos e buscas. Uýra se apresenta como “uma árvore que anda”. Nasceu em 2016, durante o processo de impeachment de Dilma Rousseff, quando a biólogo decidiu expandir sua pesquisa acadêmica e buscar formas de levar o debate sobre a conservação ambiental e os direitos indígenas e LGBT+ às comunidades de Manaus e seus arredores. Em aulas de arte e biologia, ou performances fotográficas, em maquiagens e camuflagens, em textos e instalações, o que Uýra faz é falar desde a floresta e com ela. 

Na 34ª Bienal de São Paulo, duas séries de fotografias já existentes – Elementar e Mil quase mortos – se entretecem numa montagem inspirada nas ondulações do corpo de uma cobra em movimento. As imagens são registros de performances feitas também para a câmera, às vezes unicamente para ela. São, ao mesmo tempo ações de denúncia e a evocação de seres ancestrais ou futuristas, entre utópicos e apocalípticos, de uma beleza perturbadora. A floresta ameaçada, o desmatamento, o fogo; a água submersa sobre o lixo que afoga os igarapés; a floresta que engole o corpo e o corpo que se transforma. 

A série Retomada (2021) foi desenvolvida especialmente para esta Bienal. Nestas fotografias, Uýra aparece em locais de Manaus que, seja por sua história e função social ou por suas características arquitetônicas, podem ser associados aos modos de viver herdados da cultura eurocêntrica. Mas o que a aparição de Uýra desperta, aquilo que nos faz ver, são as plantas que, aos poucos, vão retomando o espaço que já lhes pertenceu. As folhagens e raízes que começam a crescer em cercas e muros, frestas e fendas; os arbustos que se agrupam em beiras de ruas e estradas; as árvores que terminam por romper o concreto e tomar construções abandonadas. Locais de abandono e violência que seguem reocupados pela Vida.

Complementa esta série de imagens uma instalação também inédita, Malhadeira (2021), que sobrepõe a um desenho da malha de ruas e avenidas conectadas à avenida Constantino Nery, em Manaus, uma rede sinuosa de fios orgânicos com sementes de seringa. Antonio Constantino Nery foi governador do Amazonas no início do século passado, época em que a extração da borracha das seringueiras era a principal atividade econômica da região. Foi responsável (mas não responsabilizado) pela chacina de 283 indígenas do povo Waimiri-Atroari. Foi responsável, também, pelo aterramento de parte da malha hidrográfica que banhava a cidade, soterrando os rios para a construção da avenida que leva seu nome. A obra nos faz pensar nas relações entre o extrativismo como modelo econômico e a violência contra os habitantes da terra, dos homens e mulheres aos córregos e rios. Os fios de sementes serpenteando sobre as linhas retas trazem de volta o desenho das águas, a memória dos cantos que ela sabe cantar. 



  1. Caroline A. Jones, Eyesight Alone: Clement Greenberg’s Modernism and the Bureaucratization of the Senses (Chicago: University of Chicago Press, 2005).
  2. Greenberg’s Modernism and the Bureaucratization of the Senses (Chicago: University of Chicago Press, 2005).
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