A biografia e a obra de Manthia Diawara (1953, Bamako, Mali) são marcadas pela vivência e pelo profundo conhecimento, tanto num nível pessoal quanto no acadêmico e intelectual, da história e da cultura negra africana e afro-americana. Crítico e professor de literatura comparada e cinema, escritor e cineasta, Diawara segue em seus filmes os preceitos do cinema etnográfico de autores como Jean Rouch, cuja importância foi ao mesmo tempo reconhecida e questionada em Rouch in reverse [Rouch em reverso] (1995). Ao descrever o filme, Diawara explica: “Fiz esse filme sobre Rouch como um rito de passagem para mim mesmo. [...] Queria passar por Rouch para tornar visíveis novas vozes e novas imagens da África; as que desafiam os estereótipos e o primitivismo”. Esse desejo de subverter a dinâmica convencional da antropologia, fazendo com que o antigo “objeto de estudo” (o negro africano) passe a ser o agente questionador, é o que move a maioria dos filmes de Diawara, nos quais o diretor é quem conduz, em cena, a narrativa, fazendo perguntas, pedindo explicações, assumindo o papel socrático de quem admite (ou finge) não saber, para chegar ao âmago das coisas.
Por meio de seus filmes, Diawara tem construído um repertório extremamente rico e estratificado de retratos de pensadores de várias partes do mundo, que são convocados para um diálogo imaginário na instalação concebida para a 34ª Bienal, uma espécie de “parlamento” de autores fundamentais para a formação do próprio artista e para a compreensão do mundo em que vivemos. Tendo entre seus protagonistas Édouard Glissant, referência fundamental na concepção da exposição, a instalação reúne escritores, artistas, poetas, políticos e pensadores de várias épocas e lugares, como Wole Soyinka, Angela Davis e David Hammons, entre outros, numa conversa composta por meio de falas gravadas por Diawara ao longo das últimas décadas. Para além dos assuntos abordados diretamente nas falas dos protagonistas, a instalação pode ser lida, também, como uma meditação sobre o tempo e sobre as transformações que ele traz, tanto na evolução de teorias sociais, políticas e filosóficas, quanto no plano pessoal e íntimo. Temas caros a Glissant – como a “poética da relação” e a defesa do direito à “opacidade” do pensamento e da personalidade de cada um – permeiam a instalação e atualizam o legado do grande pensador martinicano, amigo pessoal e objeto de estudo de longa data de Diawara.
Apoio: Institut français à Paris
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Caroline A. Jones, Eyesight Alone: Clement Greenberg’s Modernism and the Bureaucratization of the Senses (Chicago: University of Chicago Press, 2005).
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Greenberg’s Modernism and the Bureaucratization of the Senses (Chicago: University of Chicago Press, 2005).